Ilustração do livro "No Guts, No Glory"
Neste artigo, trago trechos de uma entrevista dada pelo Major
General Frederick C. "Boots" Blesse Piloto de caça ás da Guerra da Coréia ao site "Secrets of War" (Segredos de Guerra - SG) em 1997.
Boots voou caças a jato F-86 Sabre para a USAF,
abateu dez MiGs, Escreveu o livro "No Guts, No Glory"
(Sem coragem, não há glória) - um manual para pilotos de caça. Nesta entrevista "Boots" descreve características de um bom piloto de caça, a estrutura tática organizacional de uma esquadrilha, e detalhes sobre "No Guts, No Glory".
"Boots" Blesse em seu F-86 Sabre
Frederick C. Blesse nasceu na
Zona do Canal do Panamá em 1921. Seu pai foi um General de Brigada no Corpo
Médico do Exército dos Estados Unidos. Boots concluiu o ginásio na escola
americana de Manila em 1939. Ele foi graduado em West Point em 1945 como um
piloto no Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos.
Nos três anos seguintes ele
voou aviões de caça P-40, P-51, P-47 e F-80. Em 1949 ele foi para a Base da
Força Aérea de Selfridge, como piloto de caça a jato. Durante a Guerra da Coréia,
ele voou voluntariamente dois tours de combate, de novembro de 1950 a maio de 1951 e de
abril de 1952 a
outubro de 1952, voando mais de 200
missões em P-51 Mustangs, F-80 Shooting Satars e F-86 Sabres.
Durante seu segundo tour de
combate, ele foi creditado oficialmente pela destruição de nove aeronaves MiGs-15
um LA-9; um provável e três MiGs-15 danificados. Ele era o maior ás americano a
jato quando voltou para a casa em outubro de 1952.
F-86 Sabre
(Blesse): Meu nome é Major
General Frederick C. Blesse, mas ninguém me chama mesmo de Frederick. Meu nome,
meu apelido é "Boots," e é assim que todo mundo me chama. Boots . Significa "ferido" em francês.
(SG) O que você tem que ser,
para ter sucesso em pegar MiGs?
Que tipo de personalidade
precisa ter?
(Blesse): Para ter sucesso em
combate aéreo primeiramente você tem que querer fazê-lo. Em segundo lugar, você
precisa ter alguma experiência anterior de tática em jatos. Você precisava
conhecer algo sobre dogfight, ter alguma idéia sobre taxa de aproximação e
taxas de curva, como perder velocidade, e como ganhar velocidade. Mas o mais
importante, você tem que ser agressivo. Muita gente começou sem nada além de
agressividade e ganhou a experiência que eles precisavam ali mesmo na Coréia.
Alguns foram abatidos tentando fazê-lo. Outros foram mais bem sucedidos e o
fizeram muito bem. O ingrediente chave para ser um piloto ar-ar bem sucedido
foram experiências anteriores em táticas, agressividade e o desejo de realmente
se misturar com eles.
(SG): Descreva “se misturar
com eles".
(Blesse): Por "se misturar
com eles" eu quero dizer engajar o inimigo.
Durante meus primeiros meses na
Coréia, eu voei muitas missões quando os controladores faziam chamadas sobre
MiGs, ou nós ouvíamos outros pilotos engajando os MiGs, mas estranhamente nosso
comandante de esquadrilha nunca deixou que nos fossemos para perto deles. Nos
aglomeramos ao redor, voamos aqui e ali; mas nunca nos deixou ir até os MiGs.
Quando nós voltamos para casa,
outros esquadrões nos falavam sobre seus abates e os grandes encontros daqueles
dias. Assim se você é um comandante de esquadrilha, "se misturar com
eles" quer dizer ouvir a ação no rádio, localizar através dos
controladores ou os pilotos envolvidos, e levar sua esquadrilha até lá e
começar a lutar. Se você não deixar a tua esquadrilha entrar em combate você
também não poderá estar lá. Você estará desperdiçando um
avião de caça a jato, Você está desperdiçando o tempo de que voam, e você está
desperdiçando o tempo e a carreira dos outros pilotos. Tua missão, como
designada pela Força Aérea, é contra-aérea. Assim se você está lá em cima
voando ao redor, contornando a área esperando por talvez um MiG manco saindo do
combate, então você não estará fazendo justiça à Força Aérea. Você não estará
fazendo o trabalho para o qual contrataram você.
(SG): A sorte foi um fator?
(Blesse): Cada indivíduo que voou nesta guerra
ar-ar realmente queria se tornar um ás. Alguns tiveram a sorte de marcar cinco
abates e outros não. Exigiu mais que apenas vontade, capacidade e
agressividade. Exigiu um pouco de sorte. Vi pela primeira vez um MiG quando eu
estava voando com coronel Mahurin na minha segunda missão.
Não o pegamos porque nossos
Sabres estavam quase sem combustível. Mas nós disparamos as armas de fogo o que
foi uma experiência agradável para mim. Eu acho que foi porque ele me deixou
fazê-lo. Mas não vi outro MiG até minha quadragésima oitava missão.
Voei para frente e para trás, e
para cima e para baixo, e carregando as armas, e um muitas vezes eu estava
brincando comigo mesmo. Os MiGs não estavam voando, ou eles não estavam voando
em minha área designada.
Mas Jim Low chegou sem qualquer
experiência, tão agressivo como o inferno. Um dia, ele quebrou formação com seu
comandante de esquadrilha, desceu e derrubou um MiG. É difícil disciplinar um
cara que volta com um abate, mesmo que ele tenha quebrado as regras. Eu assisti
esses caras fazerem isso por um tempo, e ninguém queria conseguir deles
qualquer coisa a mais do que eu fiz. Mas os MiGs estavam ao redor.
Ocasionalmente alguém conseguia pegar um.
(SG): Como os membros de uma
formação de quatro aviões (esquadrilha) devem trabalhar juntos?
(Blesse): Fiz algumas mudanças
importantes em nossas táticas no esquadrão 334. Quando eu cheguei, eles estavam
usando táticas defensivas. Eles voavam amplamente separados; para se prevenir
com inimigo vindo para o meio dos aviões. Mas isso não era muito bom. Se alguém
ataca você e teu ala e em seguida sai fora, você esta em um grande problema
porque um par de curvas rápidas e este cara vai embora para sempre. Você teria
sorte de vê-lo à hora da ceia. Então nós trouxemos o ala perto o suficiente
para ler os números pequenos na calda do F-86 líder. E então ele estava no
lugar certo. Não queríamos que ele viesse a colidir com o líder. Porque se o
líder de esquadrilha fizer uma curva rápida em direção a ele, eles vão colidir.
Colocamos o ala um pouco para trás, e então nós voltamos a treiná-lo assim ele
permanecia por perto. Ele teria que "vir a reboque". O líder poderia fazer qualquer coisa que quisesse, e seu ala viria
a reboque com ele. Ele poderia vigiar ao redor em todas as direções, mantendo o
líder livre para fazer um ataque.
Formatura de combate, Ilustração do livro "No Guts, No Glory"
Mas era uma equipe de quatro
homens. Um era líder de esquadrilha, e seu ala (número dois). Então você tem um
líder de elemento (número três) e seu ala (número quatro). O líder de elemento
geralmente viaja alto na formatura, para que ele pudesse permanecer com o líder
da esquadrilha, caso o líder tenha optado por manter sua esquadrilha de quatro
aeronaves em como uma unidade. Muitas vezes nós quebramos a formatura de quatro
para dois, mas nós nunca quebramos de dois para um. Você iria atacar uma
esquadrilha, e talvez dois MiGs quebrassem à esquerda e os outros dois para a
direita.
A mensagem era simples:
"Black tree, pegue os dois
indo para a direita. Eu pego os da esquerda."
Nós nos dividíamos para depois
nos unirmos de volta nas operações. Talvez alguém conseguisse um abate desta
maneira. Mas dois dos quatro homens não eram atiradores, eles eram
observadores. Eles protegiam os homens número um e três. Os líderes tinham mais
experiência, eles deveriam ter mais sucesso no combate. Os homens número dois e
quatro eram pessoas que tinha chegado recentemente no esquadrão. Em nosso
esquadrão os caras novos voavam com alas. Eu fiz isso quando cheguei.
Como um cara começa muito
determinado em relação ao tipo de uma excursão que ele voa. Se você colocá-lo
com um capitão "Milquetoast" e deixá-lo voar com ele por dez
missões, e em seguida, colocá-lo com um cara que estava realmente envolvido,
ele iria voltar pensando que este outro cara é louco, tirando todas estas
possibilidades. O novo piloto pensaria, "Eu não quero voar com ele nunca
mais".
Mas se você deixar o cara novo
voar suas dez primeiras missões com um piloto agressivo, alguém que realmente
está envolvido e sabe o que está fazendo, e então você coloca a nova cara com
capitão Milquetoast, ele iria voltar e dizer, "Nossa, não
me coloque com aquele cara novamente".
Após cerca de quinze missões,
nós realmente veríamos como um novo piloto se sairia com um líder. Se ele
estivesse se saindo bem, se ele não tivesse se perdido ou se separado do líder
ou algo parecido, nós veríamos que ele tinha características para liderança.
Nós o colocaríamos na posição de número três por um tempo e descobrir se ele
tinha o material de um líder. O homem número dois tinha a responsabilidade de
manter o líder vivo. Dissemos ao líder de esquadrilha:
"Uma vez que você tenha
visto um avião inimigo, você não tem tempo para procurar ao redor pelo teu ala,
ou teu líder de elemento, ou teu número quatro. Se você tirar os olhos de um
MiG, você provavelmente nunca mais irá vê-lo novamente.
(SF): Sobre o que se trata o
termo "Padlock"?
(Blesse): O líder usa o termo
"Padlock" para informar sua esquadrilha que ele avistou um avião
inimigo e irá manobrar com ele. Quando o líder declara:
"Padlock, duas
horas alto,"
...isto informa ao homem número dois que ele pode esperar alguma
manobra brusca. O líder fará todas estas curvas, ele pode fazer um looping ou
qualquer coisa necessária para ganhar uma vantagem em relação ao avião inimigo.
Uma vez que o líder tenha ganhado uma vantagem em relação ao MiG, e ele se
estabelece assim, o ala escorrega para a direita checa a retaguarda, e declara,
"Vermelho líder, você está
limpo."
Era imperativo que ele fizesse
esta declaração a cada quinze segundos. Se ele não fizesse, isso geralmente
significava que ele tinha sido abatido, ou tinha se perdido, ou tinha saído da formatura por causa de uma curva, e ele não sabia onde estava o líder. Assim era
muito importante que o ala e o líder de elemento soubessem que o líder de
esquadrilha tinha declarado "Padlock". Isso significava que o ele
iria focar cem por cento de seu esforço em derrubar o avião que ele viu.
Aqueles outros caras (os alas) tinham que devotar cem por cento da atenção para
o papel defensivo (vigilância defensiva).
Estrutura organizacional de uma formação de quatro aeronaves (Esquadrilhas) e
suas unidades primárias (Elementos).
Formatura de patrulha utilizada na Coréia (Escalonada à direita)
(SG): Como uma esquadrilha
de quatro aviões opera como uma equipe? Quais são as regras?
(Blesse): A situação tática no combate aéreo requer
que você siga algumas regras. Por exemplo, quando o líder declara
"Padlock," o ala deve ficar cem por cento, olho por olho, procurando
por aviões inimigos por trás, assegurando que o líder não seja surpreendido.
Isto é parte das regras.
Mas suponha que você está
olhando ao redor a procura de aeronaves inimigas, e de repente o homem número
quatro vê o inimigo e ninguém mais, ai declara:
"Eles estão ás três, eles estão às três
horas alto, dois MiGs."
Agora você está em um ponto de decisão. A regra
diz que o número quatro continue a informar o líder e dizer onde eles estão.
"Vire para a direita. Ok
agora, diretamente para cima, Ele está bem à sua frente, 12, cerca de duas
milhas."
E eventualmente o líder diz:
"Ok, eu peguei eles."
Então o três e o quatro
continuam. O quatro mantém sua posição e faz o seu trabalho designado. Esta é
uma das maneiras de lidar com isso.
Por outro lado - quebrando as
regras - o número quatro vê o MiG.
Ele ainda não viu um antes; Ele
acha que ele pode conseguir um abate imediatamente; Ele não quer perder a
oportunidade; Ele não dá a mínima para as regras, e lá vai ele. Talvez ele seja
abatido fazendo isto. Mas se o cara é um bom piloto, Se ele é agressivo, Ele
pode dirigir-se para lá e conseguir um abate. Ele vai para casa sozinho e consegue uma engraçada mordida sobre disciplina de vôo.
Você quebra as regras não
agindo como um membro da equipe. O líder é o atirador, e o homem número três será atirador se o par se quebrar. E o líder que decidirá quando isto acontecerá.
Se por exemplo, o número três tiver visto o MiG e o chamou, e o líder não
conseguiu vê-los, o líder poderia dizer,
"Pegue-os, três. Você os
pega. Eu cobrirei você."
Como o número três vai para
cima deles, o líder cobrirá o elemento atacante. Ele pode passar a liderança. O
líder de elemento geralmente é um cara muito confiável e tem experiência
suficiente para atacar sem expor as outras pessoas.
Normalmente, os números dois e
quatro homens não têm a experiência de saltar para a liderança sem expor
desnecessariamente o homem número três, ou o líder. Tudo ficaria todo amassado.
Você teria encanadores fazendo trabalhos dos eletricistas, e eletricistas
fazendo trabalho de encanador, Porque o líder não é usado para voar na ala. Ele
pode voar na ala, Mas ele não está praticando isso todo dia como número dois e
número quatro. Que é seu meio de ganhar a vida - sendo bons alas. Os meios de
vida do líder, e o homem número três, é ser um bom caçador, procurar os
inimigos e derrubá-los. E para se certificar de que eles voltam para casa com uma
esquadrilha completa.
Capa do livro "No Guts, No Glory"
(SG): Que uso você fez dos
conhecimentos táticos ganhos na Coréia?
(Blesse): Eu trouxe a
informação e experiência doutrinária que nós tínhamos aprendido de volta para
nossa equipe tática Base da Força Aérea de Nellis, onde todo o treinamento de
F-86 era conduzido. Eu comandei um dos esquadrões deles. Nós formamos uma
equipe tática e trabalhávamos com outras unidades F-86. Alguns uniformizados da
marinha e fuzileiros visitavam Nellis nos fins de semana e nós trabalhávamos
com eles. Em março de 1955, o General Ben Davis, na divisão de caças do Pentágono,
mandou minha equipe tática para o estremo oriente para avaliar nossos colegas
de F-86 de lá. Eu tinha uma equipe que era minha mesmo, Capitão Brooks Lauss, Don
Pascow e Walter Druin. Nós fomos para o pacífico e voamos com todos os
esquadrões do extremo oriente, e os avaliamos, e infelizmente alguns dos
comandantes de ala foram demitidos por causa do que estava acontecendo por lá.
Em Nellis nós estávamos
ensinando as táticas que nós usamos no esquadrão 334 na Coréia. Eu voltei para
Nellis e eu comecei a ensinar isto para o meu esquadrão de lá e para todos os
meus alunos. O comandante do grupo decidiu fazer isto com toda ala, e assim nós
ensinamos isto para os outros seis esquadrões ali. Então eles queriam que eu
levasse esse fardo de táticas para o extremo oriente. Eu escrevi um pequeno
manuscrito de três páginas para dar aos fuzileiros e outros pilotos que estavam
voando conosco, assim eles poderiam se lembrar do que estávamos fazendo. O que
parecia um pouco inadequado para algo que foi ditado pelo Pentágono. Assim eu
escrevi um manual chamado "No Guts No Glory." Eu não queria aborrecer
todos até a morte assim eu fui até a equipe escola de caças e táticas e pedi a
um de seus ilustradores para me ajudar. Eu disse a ele, "Aqui esta a
doutrina. Isto é o que nós estamos fazendo." Eu tinha algumas idéias para
os cartoons e ele fez as ilustrações.
(SG): Vocês começaram o que
ficou conhecido como Força Aérea na Coréia mesmo. Como isto fez você se sentir?
Quero dizer, o que você sentiu que estava fazendo na época?
(Blesse): Nosso trabalho na Coréia foi
muito importante porque foi o primeiro registro de uma boa experiência tática
ar-ar da Força Aérea. Eu nunca senti que inventamos algo. Eu tinha lido artigos
de pilotos de caça britânicos. Peguei idéias de Gerry Johnson, Bud Mahurin,
Gabby Gabreski e outras pessoas com quem eu conversei e com quem voei. Todos
eles tinham idéias. Eu peguei o que tinha funcionado para eles e acrescentei
algumas coisas que eram um pouco mais fáceis em jatos. Combinaram-se todas as
coisas diferentes que foram aprendidas na segunda guerra mundial e na Coréia.
Mas eu sempre senti que nós estávamos cortando um novo nicho para a força
aérea. Íamos a áreas onde ninguém tinha ido antes, e dando-lhes algumas
informações muito boas. Eu estava muito orgulhoso disso.
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